QUALIDADE DE ATENDIMENTO PARA A POPULAÇÃO LGBT NO SUS: UMA ANÁLISE DO PONTO DE VISTA DO PACIENTE
DOI:
https://doi.org/10.55811/integrar/livros/3787Palavras-chave:
atendimento no SUS, LGBT, preconceito, qualidade do atendimento, treinamento de profissionais de saúdeResumo
Introdução: Questões relacionadas à identidade e expressão de gênero, assim como a orientação sexual, são desafios enfrentados diariamente na sociedade. A exclusão social e o preconceito, incluindo as LGBTfobias, têm um impacto direto na qualidade de vida das pessoas. A Política Nacional de Saúde LGBT, reconhecendo os efeitos da discriminação e da exclusão no adoecimento da população LGBT, criou em 2008 o Programa Mais Saúde. O objetivo dessa política é promover o compromisso do Sistema Único de Saúde (SUS) com seus princípios, visando à equidade na saúde para população LGBT por meio de medidas que melhoram o acesso, a qualidade do atendimento e a educação dos profissionais de saúde. Objetivo: O objeto da nossa pesquisa é examinar de que maneira a identidade de gênero e a orientação sexual podem afetar o acesso e a qualidade dos serviços de saúde prestados para a população LGBT (lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais), no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). O objetivo é mapear, identificar e compreender as diferentes facetas do acesso aos serviços de saúde e sua qualidade, sob a perspectiva dos pacientes em suas vivências nos atendimentos. Material e Método: O presente trabalho realizou-se no estado do Rio de Janeiro e fez parte de uma pesquisa multicêntrica brasileira realizada pelo Ministério da Saúde. Foi utilizada uma metodologia qualitativa, partindo da estrutura dos relatos transcritos das entrevistas realizadas, apreendendo as construções ideológicas ali inseridas e analisando-as dentro de um contexto de análise do discurso. Todos os participantes entrevistados faziam parte da população LGBT. Foram realizados grupos focais, cada um com participação média de oito integrantes. Utilizou-se um roteiro próprio com perguntas semiestruturadas confeccionado pela equipe de pesquisadores do projeto. Antes das entrevistas de campo, foram realizados testes com o instrumento e diversas oficinas de treinamento dos coordenadores dos grupos. As informações dadas pelo participantes foram registradas em meio eletrônico para posterior transcrição e análise. Procurou-se, sempre que possível, realizar grupos homogêneos desta população. Em uma fase final de triangulação dos dados, procurou-se avaliar congruências e incongruências dos relatos. Resultados: O grupo LGBT é composto por diversos subgrupos, cada um deles apresentou características e peculiaridades diferenciadas. Desta forma, sempre que opiniões e posicionamentos exprimirem questões de um grupo específico isto foi assinalado. De uma maneira geral, grande parte dos depoimentos assinala a questão do desconhecimento técnico dos profissionais de saúde para lidar com questões LGBT. Isto fica ainda mais claro para o grupo dos transsexuais, onde frequentemente questões e problemas relacionadas aos órgãos do sexo biológico, tratamentos hormonais ou possibilidades de ações transexualizadoras, ficavam quase sempre sem uma conduta ou resposta adequadas. Houve também grande inabilidade para tratar peculiaridades de aspectos comportamentais LGBT, assim como questões psicológicas. Estes assuntos em geral também foram ignorados ou negligenciados durante os atendimentos. Não raro, a questão LGBT era tratada como uma questão de “doença” ou “anormalidade”, ficando a impressão que durante as consultas existia veladamente “um aconselhamento”, sugerindo a adoção de “outros comportamentos” em relação à sexualidade. Outra queixa frequente relacionou-se à abordagem de questões LGBT pelos profissionais, questões relacionadas à sexualidade eram evitadas como um tabu. Isto dificultou bastante a comunicação e uma interação adequada nos atendimentos, acarretando também em barreiras para a abordagem das questões de saúde, principalmente as que se relacionavam à situações específicas da população. A postura mais frequentemente encontrada foi um tratamento que ignorou ou mesmo “evitou” uma abordagem destes aspectos, com o tratamento instituído durante as consultas seguindo uma rotina “tal como se o paciente fosse uma pessoa hétero”. Outra crítica frequente, relacionou-se à ênfase em abordar nos atendimentos questões relacionadas ao HIV e outras DST. Este assunto era por vezes priorizado na consulta, “como se essa fosse a única razão para um atendimento de saúde”, mesmo sem terem sido um assunto trazido ou de interesse do paciente. Cabe ressaltar que também foram mencionadas exceções à esta regra. Havendo em consequência, um “mapeamento” das equipes que demonstram maior habilidade no trato destas pessoas, implicando por vezes em deslocamentos para áreas muito distantes com o objetivo de realizar um tratamento de saúde de maior qualidade. Conclusões: A análise do acesso e qualidade do atendimento nos atendimentos do SUS não difere, de uma maneira geral, da discriminação já sofrida pelo grupo em relação ao seu convívio social no dia a dia. Um agravante no contexto da saúde, relaciona-se ao fato de poderem implicar em consequências com potencial de dano ainda maior à pessoa. Ainda parece existir um grande trabalho a ser feito de conscientização, prestação de informação e treinamento para profissionais de saúde.